segunda-feira, 8 de setembro de 2014

“Marina tem um projeto pessoal de ser presidente, custe o que custar”

Leonardo Boff
Em longa entrevista concedida à jornalista Conceição Lemes, do blog Viomundo, publicada sob o títutlo “Pobres perderam uma aliada e os opulentos ganharam uma legitimadora”, o intelectual, escritor e um dos principais nomes da Teologia da Libertação, Leonardo Boff, explica por que não votará este ano na candidata do PSB, Marina Silva, que ele apoiou em 2010.
“Está ficando cada vez mais claro que Marina tem um projeto pessoal de ser presidente, custe o que custar. Numa ocasião, ela chegou a declarar que um dos objetivos desta eleição é tirar o PT do poder, o que faz supor mágoas não digeridas contra o PT que ajudou a fundar”, lamenta Boff que conhece a candidata de longa data, desde os tempos em que Marina atuava no Acre.
Com sua didatismo de sempre, Boff discute as propostas da candidata para várias áreas e aponta os riscos de uma eventual eleição de Marina ao Planalto. Sobre a posição da candidata em relação à independência do Banco Central (BC), Boff é categórico: “uma falta total de brasilidade. Isso significa renunciar à soberania monetária do país e entregá-la ao jogo do mercado, dos bancos e do sistema financeiro capitalista nacional e transnacional”.
E complementa: “um presidente/a é eleito para governar seu povo e um dos instrumentos principais é o controle monetário que assim (com a independência do BC) lhe é subtraído. Isso é absolutamente antidemocrático e comporta submissão à tirania das finanças cada vez mais voraz, pondo países inteiros à falência como é o caso da Grécia, da Espanha, da Itália, de Portugal e outros”.
Receituário neoliberal
Ele lamenta a adesão de Marina ao “receituário neoliberal” sobre o qual, lembra Boff, a candidata fala “com certo orgulho inconsciente, sem dar-se conta do que isso realmente significa: mercado livre, redução dos gastos públicos (menos médicos, menos professores, menos agentes sociais etc), flutuação do dólar e contenção da inflação com a eventual alta de juros. Como consequência, arrocho salarial, desemprego, fome nas famílias pobres, mortes evitáveis”. Boff conclui: “É o pior que poderia nos acontecer”.
“Tudo isso vem sob o nome genérico de ‘austeridade fiscal’, que está afundando as economias da zona do Euro e não deu certo em lugar nenhum do mundo, se olharmos a política econômica a partir da maioria da população. Dão certo para os ricos que ficam cada vez mas ricos, como é o caso dos EUA onde 1% da população ganha o equivalente ao que ganham 99% das pessoas. Hoje os EUA são um dos países mais desiguais do mundo”.
Fundamentalismo 
Em sua defesa do Estado laico e da convivência pacífica e respeitosa das religiões em nosso país, Leonardo Boff vê o fundamentalismo na candidata do PSB. ”O que Marina pratica é o fundamentalismo. Este é uma patologia de muitas religiões, inclusive de grupos católicos. O fundamentalismo não é uma doutrina. É uma maneira de entender a doutrina: ‘a minha é a única verdadeira e as demais estão erradas e como tais não têm direito nenhum’. Graças a Deus que isso fica apenas no plano das ideias. Mas facilmente pode passar para o plano da prática”.
Cita, ainda, o comportamento da candidata em relação ao conteúdo do programa do PSB voltado à população LGBT, após a manifestação do pastor Silas Malafaia. “O Malafaia, líder da Igreja Assembleia de Deus à qual Marina pertence, é o seu Papa. O Papa falou, ela, fundamentalisticamente obedece, pois vê nisso a vontade de Deus. E, aí, muda de opinião. Creio que não o faz por oportunismo político, mas por obediência à autoridade religiosa, o que acho, no regime democrático, injustificável”.
Boff lembra que “um presidente/a deve obediência à Constituição e ao povo que a elegeu e não a uma autoridade exterior à sociedade. Um fundamentalista é um dos atores políticos menos indicado  para exercer o cargo da responsabilidade de um presidente (…) Se um presidente obedece mais aos preceitos de sua religião do que aos da Constituição, fere a democracia e entra em conflito permanente com outros até de sua base de sustentação, pois os preceitos de uma religião particular não podem prevalecer sobre a totalidade da sociedade”.
“Não é uma pessoa de síntese, mas de divisão”
Boff declara sua estima pela inteireza pessoal de Marina Silva, pela “sua visão espiritualista (abstraindo o fundamentalismo)” e por “sua busca de ética em tudo o que faz”. Mas, justifica sua não adesão à candidatura do PSB: “estimo a pessoa, mas questiono o ator político. Acho que não tem a inteligência política para fazer as alianças certas”.
“O presidente deve ser uma pessoa de síntese, capaz de equilibrar os interesses e resolver conflitos para que não sejam danosos e chegar a soluções de ganha-ganha. Para isso precisa-se de habilidade, coisa que em Lula sobrava. Marina, por causa de seu fundamentalismo, não é uma pessoa de síntese, mas antes de divisão”.
“Lendo o programa de governo do PSB de Marina parece que fazemos um passeio ao jardim do Éden. Tudo é harmonioso, sem conflitos, tudo se ordena para o bem do povo. Se entre os melhores estiver um político, para aceitar seu convite, deverá abandonar seu partido e com isso, segundo a atual legislação, perderia o mandato. Ela necessariamente, se quiser governar, deverá fazer alianças, pois temos um presidencialismo de coalizão”, complementa.
E aponta: “Está ficando cada vez mais claro que Marina tem um projeto pessoal de ser presidente, custe o que custar. Numa ocasião, ela chegou a declarar que um dos objetivos desta eleição é tirar o PT do poder, o que faz supor mágoas não digeridas contra o PT que ajudou a fundar”.
Cliquem aqui e leiam a íntegra da entrevista de Leonardo Boff

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