O lado bom da rebelião aliada
Por Kennedy Alencar *
A presidente Dilma Rousseff não está tratando o PMDB como Luiz Inácio Lula da Silva tratou no seu segundo mandato. Mas ainda está cuidando um pouco melhor do que Lula cuidou no início do seu primeiro termo.
Isso é ruim? Arriscado?
É mais arriscado do que ruim.
Certamente, mais dureza no trato de pedidos fisiológicos é bom para o país e pedagógico para a política. Os peemedebistas usam o eufemismo da falta de atenção do governo. Ora, o que querem mesmo são cargos e verbas.
Que grande ideia econômica e social o PMDB apresentou ao país nos últimos anos? Com exceção de Sérgio Cabral, governador do Rio, que aplicou uma política de segurança pública respaldada pela maioria da opinião pública do seu Estado, não se tem notícia de uma ideia peemedebista para enfrentar a invasão de produtos chineses, a valorização excessiva do real, uma proposta efetiva de reforma tributária...
Quando se queixa de que o PT busca hegemonia na política, o PMDB está colhendo o que plantou. O partido tem sido linha auxiliar dos presidentes da República desde a redemocratização. Verdade que era dono do governo José Sarney, que deu no que deu. Depois, só foi coadjuvante.
PT e PSDB polarizam a política nacional desde 1994 porque são os únicos partidos que apresentaram projetos que o conjunto da sociedade julgou que valia a pena endossar.
Dilma tem menos compromissos políticos do que tinham Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Basicamente, ela deve uma fatura para Lula. Claro que a presidente precisa do PMDB para governar. Atender pleitos de liberação de emendas parlamentares faz parte do jogo.
Mas ficar querendo nomear diretor de banco já é outra história.
O ponto central da crise entre o Palácio do Planalto e o Congresso é saber a medida exata do endurecimento com os políticos. Com menos compromissos, a presidente tem um pouco mais de espaço para esticar a corda. Talvez já esteja esticada demais, mas tem sido uma experiência interessante para o país e, sobretudo, para o jornalismo, que, aliás, precisa decidir se gosta da Dilma que enfrenta os políticos ou da Dilma que tem de ceder rapidamente às raposas felpudas em nome da governabilidade. Interessante notar uma certa oscilação de segmentos sociais. Ora, para ver o circo pegar fogo, ajoelham no hipócrito altar udenista. Ora, quando algumas fontes choram, pedem realpolitik na veia.
A derrota da semana passada no Senado foi um revés, mas não tirou o Brasil dos trilhos. Provavelmente, vai atrasar o projeto do trem bala. Há projetos importantes tramitando no Congresso, como o novo Código Florestal e o fundo de previdência dos servidores públicos. Eventuais retaliações a Dilma, dando ao código uma feição mais ruralista ou adiando a medida que contribui para equilibrar as contas da Previdência, serão também retaliações ao país, mas não vão afundá-lo. O Brasil tem cada vez mais uma opinião pública que deseja maior transparência dos políticos, do judiciário, das empresas, da imprensa. Dilma está surfando nessa onda, embalada pelas pesquisas que lhe dão popularidade e por uma economia ainda em boa toada.
É, sim, arriscado tensionar a relação com um partido do tamanho do PMDB. Também é arriscado fazê-lo com outras siglas aliadas. Mas há um lado bom: obrigar os que querem cargos e verbas a parar com essa conversa fiada de falta de atenção e levá-los assumir claramente os interesses que defendem. Ou seja, uma crise assim no segundo ano de governo tem alguma utilidade. O problema poderá ficar preocupante para Dilma em 2014, se ódios e mágoas conseguirem quebrar a aliança que sustenta sua administração e dificultar uma eventual reeleição.
* Kennedy Alencar é jornalista, escreve para A folha.com
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