quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

PERSPECTIVAS PARA O BRASIL RURAL1

Por Joacir Rufino de Aquino (Economista e professor da UERN)


O modelo de desenvolvimento capitalista vigente no campo brasileiro se baseou historicamente na apropriação privada dos recursos naturais associados à terra (solo, água e biodiversidade) e em um padrão tecnológico produtivista, assentado no uso intensivo de máquinas e insumos químicos. Atualmente, a despeito de seus ganhos de escala, este modelo agrícola tem sido questionado pelos seus elevados custos sociais e ambientais, sinalizando a necessidade de mudanças em sua configuração.

Nesse contexto, é possível apontar algumas tendências no que diz respeito às perspectivas para o Brasil rural no início do século XXI. Tais tendências podem ser resumidas em dois projetos em constante disputa por reconhecimento e legitimidade política. O projeto tradicional é centrado no “agronegócio” e apresenta um viés puramente setorial e produtivista. Para os seus defensores, o caminho do campo só pode ser um: o da grande propriedade modernizada tecnologicamente tocada por trabalhadores assalariados. O que importa, nesta concepção, é produzir para exportar a qualquer custo.

Conforme explica o economista potiguar Guilherme Delgado, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a economia do agronegócio passou por um vigoroso processo de reorganização a partir dos anos 2000. Além de elevar os índices de produção e produtividade das lavouras e dos rebanhos, o setor agroexportador tem procurado aumentar sua influência no âmbito da estrutura governamental, buscando defender seus interesses. Um bom exemplo disso foi o acordo partidário que acabou de elevar a senadora Kátia Abreu, uma das principais porta-vozes da agricultura patronal, ao posto de Ministra da Agricultura do segundo governo Dilma Rousseff (PT), iniciado em primeiro de janeiro do corrente ano.

Mas a via do agronegócio, apesar da propaganda de sua inquestionável superioridade, não é o único caminho possível e desejável para a sociedade. Ao lado dela, observa-se nas duas últimas décadas o surgimento de um projeto alternativo que enfatiza a “agricultura familiar” como um setor viável para reduzir a desigualdade no campo e assegurar a produção de alimentos saudáveis. Os defensores dessa segunda via argumentam que o avanço da reforma agrária e o fortalecimento da agricultura familiar são os pilares sobre os quais é possível edificar um novo estilo de desenvolvimento rural.

De acordo com os princípios do projeto de valorização da agricultura familiar, segmento que engloba 84% dos estabelecimentos agropecuários do país e que absorve mais de 12 milhões de pessoas, o meio rural não deve ser encarado unicamente como um local dedicado a plantações e fazendas de gado, mas também como um lugar de vida. Ou seja, o que está em jogo é uma forma mais democrática de apropriação e uso do espaço agrário, onde as comunidades habitadas por famílias agricultoras possam prosperar e enriquecer o tecido social do interior do país.

O que se reivindica é, então, uma estratégia de desenvolvimento que avance além dos investimentos centrados na produção de mercadorias. A luta dos variados segmentos de agricultores familiares brasileiros é por terra, casa, segurança alimentar e qualidade de vida. Essa proposta, embora seja estratégica no sentido de minimizar o agravamento dos problemas urbanos existentes no país, não conseguiu ocupar até agora um lugar de destaque na agenda de prioridades do Estado brasileiro que necessita das divisas em moeda estrangeira geradas pelos exportadores de soja e outras commodities para fechar o rombo nas contas externas, e, por conta disso, continua privilegiando todos os anos os grandes produtores com mais de 80% dos recursos da política de crédito agrícola.

Portanto, o destino do rural está intimamente ligado aos rumos do embate entre os dois projetos ora apresentados. O mais indicado seria encontrar um ponto de equilíbrio na distribuição dos fundos públicos. Porém, na presente conjuntura, o agronegócio continua sendo a opção preferida das elites no Brasil. Ademais, o segmento familiar, com exceção dos estados da região Sul, ainda se mostra bastante enfraquecido política e economicamente. Isso significa que os movimentos sociais que representam esse conjunto de produtores, especialmente sua fração mais pobre, precisam se unir e fortalecer suas bases de apoio para tentar conquistar os meios necessários à promoção do bem-estar social das populações situadas nos diferentes recantos rurais do território nacional.

Artigo publicado no jornal O Mossoroense, Mossoró/RN, 7 de janeiro de 2015. p. 5. Disponível em:

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